“O século XIX terminou e não terminou em 1900[1]”.
É o caso de um quadro, Apolo e as Musas, de Abel Manta, de 1934, que sempre nos intrigou, dada a continuada convivência académica, e onde a crueldade dos gestos das Musas aliada ao desespero de Apolo, sempre nos fez desconfiar das virtudes de tais Musas. A composição, de pendor classicista, deste quadro de Abel Manta, reflecte o gosto da Academia e da Escola de Belas Artes[2] de então. Do naturalismo pitoresco ao romantismo elegíaco, a arte portuguesa do início do século XX, assim como é o caso particular da obra de Abel Manta, encontrou nas “musas apolíneas” o mote para o pendor e tema classicista. Este quadro de um estilo que deambula entre o gosto de anafados corpos femininos, ao modo de Rubens[3], até à alegoria de um “Almoço na relva” de Édouard Manet, revela-se ainda continuador de um realismo oitocentista e termina numa retórica erudita, que tem como objectivo ser convincente nas provas do concurso para professor das Belas Artes.
Luís Barreira, Teorias da Arte (mestrado), 1999
[1] José Augusto França, A Arte em Portugal no século XIX, 2º volume, Bertrand editora, Lisboa, 3ª edição, 1990. p.313.
[2] As instituições (Escolas, Universidades) pressupõem normas, disciplinas e as disciplinas encerram toda a rigidez de regras conservadoras não consentâneas com a actividade artística.
[3] De 1932 há um nu de Abel Manta de forte inspiração nos quadros de Rubens. Nomeadamente nas banhistas.