É sabido da paixão que Miguel Sousa Tavares nutre por certos prazeres hedonistas e outras tantas práticas desadequadas ao comportamento de um homem delicado. É conhecida a sua posição sobre a Lei que proíbe o tabaco nos restaurantes e ou em recintos fechados: ameaçando-os com a perda de tão ilustre figura. Chama a esta proibição, uma medida fascizante, porque atenta contra a vontade individual de dispor do destino segundo o seu desejo. Insurge-se a favor das touradas porque estas estão “enraizadas culturalmente e dão emprego a muitas pessoas”. Alega em causa própria as inúmeras personagens do meio artístico cujas touradas e o touro foram objectos de inspiração e de paixão: Pablo Picasso, Salvador Dali, Ernest Hemingway e tantos outros. Defende a caça porque em primeiro lugar é caçador, e porque se não fosse esta prática “desportiva” a fauna já teria desaparecido, como, porventura, irá desaparecer os touros (nobre animal) se as touradas de morte acabarem. Defende-os com obstinação mas sem galhardia.
As práticas culturais enraizadas em certas regiões não podem de per si ser justificação para tais comportamentos. Elas acabam quando a força da razão, do amor pelo próximo, aniquilam o gáudio mórbido ostentado na morte pela morte. Seja ele um animal ou uma simples planta. Sr. Miguel Sousa Tavares, eu poderia recordar-lhe práticas ancestrais de sacrifícios realizados em prol de uma qualquer divindade; do deleite contagiante no Fórum romano; do prazer estampado nos espectadores assistindo a mais um auto de fé, no Terreiro do Paço, com humilhação de heréticos e apóstatas em lume brando. Como é do conhecimento de vossa excelência a afluência da populaça, aos actos da santa inquisição, era maior nos dias mais ventosos na baixa lisboeta: o vento ao retirar o vórtice da chama do condenado prolongá-lo-ia a uma morte mais lenta e penosa. O povo rejubila…
MST, todos nós matamos seres vivos para nosso sustento. O que nos separa, e é muito, é que eu não abato nenhuma árvore, nenhuma flor, e muito menos um animal, com o sentimento de júbilo sem nenhuma utilidade vital à nossa sobrevivência.Sou contra todo o gáudio obtido no sofrimento, na morte, de um qualquer ser vivo: seja ele um animal ou planta.
*Publicado inicialmente no blog "ethos"