Cabaret Voltaire
Em 5 de Fevereiro de 1916 foi decretada a morte da arte, aqui. A arte de hoje não passa de "remakes" dos dadaístas...
Muitas das observações na arte actual podem ser facilmente remontadas a Dada. Deste modo, anti elitismo, anti autoritarismo, gratuitidade, anarquia e, por fim, niilismo estão claramente implicados na doutrina dadaísta da antiarte pela antiarte (a fórmula de Tristan Tzara). Assim como no respeitante ao objecto achado e à lata de sopa assinada, eles são obviamente uma continuação, dos famosos readymades de Marcel Duchamp e Man Ray. A ideia de acaso é também uma descoberta de Dada, e foi teorizada e aplicada não pelos dadaístas mas também pelos surrealistas nas suas doutrinas da escrita automática e do objecto surrealista.
Se se analisar os novos estilos, movimentos, da arte do século XX encontrar-se-á neles certas tendências sumamente conexas entre si tendendo para albergar no seu seio a memória do conceito romântico de “artista”, ainda hoje válido; ou da universalidade da forma como algo comum a todos os sujeitos potenciais, enquanto fruidores, com faculdades de julgar e, por inerência, a criação de um gosto construído; ou da niilificação da função de criador dando-lhe um sentido de heroicidade, de super-arte, como Nietzsche expressa em Ecce Homo, dizendo: «o acto decisivo de regresso da humanidade a si próprio, que em mim se faz carne e génio».
É neste espírito, cada vez mais consciente, de um nada mais profundo em todos sentidos que o Dadaísmo se manifesta delegando um conjunto de atitudes preconizadoras a todos os movimentos vindouros. O niilismo que os dadaístas preconizaram não tem paralelo. O fim da arte está expresso em todas as atitudes e é bem patente como se refere num dos seus manifestos. Segundo os dadaístas era «inadmissível que o homem deixe qualquer vestígio atrás de si». e «medindo pelo padrão da eternidade, toda a acção humana é fútil». O dadaísmo substitui, assim, o niilismo da cultura estética por um novo niilismo, que não só discute o valor da arte mas o valor de qualquer humanismo.
No primeiro manifesto Dada de 1918, escrito por Tristan Tzara e publicado nesse mesmo ano na revista Dada de Zurique, apregoavam na revista Der Dada nº2:
«Dada não significa nada.
O que é Dada?
Uma arte?
Uma filosofia?
Uma política?
Um seguro de incêndio?
Ou: religião de estado?
Dada é realmente energia?
Ou não é absolutamente nada, isto é, tudo?».
Esta atitude irónica, sarcástica, perante a arte, desmitificando-a, tendo consciência da necessidade de a tornar acessível a um maior número de criadores. Os dadaístas, apesar de efémeros, serão os principais precursores, inspiradores, de todos os movimentos contemporâneos. Jamais a arte esteve perante uma tão grande pluralidade de modelos operativos, assim como, de agentes da criação. Em arte a criatividade descobre que a Ideia está destinada a fazer as vezes do saber de Ofício. O advento de uma nova Ideia de arte emergente da confluência do eros e do niilismo (nietzscheniano) contemporâneo que os dadaístas preconizaram até às últimas consequências fará com que os movimentos artísticos subsequentes aproveitem as suas fragmentações transformando-os em objectos de arte
Sem renunciar a ser objecto de reflexão, a pintura pós-dada recupera os direitos da subjectividade e proclama a legitimidade das obsessões individuais. Aquilo que poderá separar os dadaístas destes “movimentos” não é mais do que uma deslocação romântica no interior do logos artístico, ou seja, acharem-se ainda artistas.
Em suma, o corpo artístico nascido das doutrinas da cultura utópica, da morte de Deus, da assumpção do Super-homem, do Progresso, do Futurismo é seguramente uma arte singular. A Contemporaneidade niilista é a lenta agonia da arte que ditará a sua “coisificação”.
Ao conteúdo desta arte, digamos, destas coisas chamar-lhe-emos de corpo niilista.